Bruno Rodrigues: o emigrante que transformou um sonho da Falperra num Top 2

A história de Bruno Rodrigues é daquelas que lembram porque o automobilismo português vive tanto da paixão como da perseverança.
Emigrante no País Basco francês, sem patrocínios e com longas viagens de 850 quilómetros para cada prova, o piloto conseguiu o impensável: terminou a época de 2025 como 2º classificado da Divisão Turismo 3 no Campeonato de Portugal de Montanha JC Group, ao volante do seu Honda Civic EP3, preparado e reparado quase exclusivamente pelas suas próprias mãos.
O sonho começou na Falperra
“Desde que nasci que vou ver a Falperra. Mesmo a viver em França, fazia questão de vir. O sonho era simples: correr lá, nem que fosse uma vez”, recorda Bruno Rodrigues.
Em 2023 concretizou o desejo, ao volante de um Ford Fiesta R2 de Hugo Lopes. A experiência correu bem e acendeu o desejo de mais. “Decidi que tinha de ter o meu próprio carro e fazer uma época completa.” Comprou um Honda Civic EP3 em França, fez algumas alterações e preparou-se para 2024. Mas a estreia foi dura: uma saída de estrada logo no warm-up da Falperra pôs fim antecipado à temporada.
“Sem apoios e com uma equipa pequena, trouxe o carro para França e arranjei-o com as minhas próprias mãos — chapa e pintura. Não sou mecânico, mas até ficou bonito”, brinca.
Um novo começo com a TE Motorsport
No final de 2024, o telefone tocou e tudo mudou. “Ligaram-me a perguntar se ia correr no ano seguinte. Em dez minutos estava tudo combinado com o Telmo Costa. Nasceu a TE Motorsport.” Foi o início de uma parceria decisiva. “Tornámo-nos uma família. Partilhamos a mesma visão e isso facilita tudo.”
O arranque de 2025 não foi fácil. Em Murça, o carro entrou em modo de segurança e só tinha metade da potência. “A pista era muito técnica e nem consegui fazer reconhecimentos. Foi uma das minhas piores provas.” Na Penha, um problema no autoblocante logo no arranque acabou por destruir a caixa de velocidades. “A equipa fez o impossível, mas não deu para continuar.”




Seguiu-se a Falperra — “a prova de amor e ódio” — marcada por mau tempo e subidas anuladas. Ainda assim, a equipa trabalhou toda a noite para ter o carro pronto às três da manhã, permitindo a Bruno Rodrigues subir ao pódio. A viragem continuou na Serra da Estrela. “O carro estava perfeito, o setup incrível. Fiz P3 e só não fui segundo por um erro meu.”
Depois, em Santa Marta, o desconhecimento total do traçado e problemas pessoais impediram um bom resultado, mas em Boticas tudo se alinhou. “É o traçado que mais gosto. A presença da minha mulher deu-me força, e os tempos confirmaram: foi a minha melhor prestação da época”, coroada com mais um pódio.
A Arrábida, por fim, trouxe o merecido prémio: o 2º lugar final no campeonato na Divisão Turismo 3. “Já só precisava de acabar. Dediquei o fim de semana a ajudar o Telmo Costa, e conseguimos ambos atingir os nossos objetivos.”
Uma vida entre dois países
Ser emigrante e piloto de montanha é uma prova de resistência extra. “Às vezes vou de avião, mas é complicado: deixo os filhos na escola às 8h, voo em Bilbao, chego ao Porto à tarde e nunca dá para chegar cedo às rampas. Outras vezes faço de carro — são 850 quilómetros para cada lado. É cansativo, mas não é isso que me vai parar.”

Apesar da conquista, Bruno não esconde críticas construtivas ao panorama nacional. “A FPAK podia simplificar regulamentos e ouvir mais os pilotos. Há falta de equidade entre categorias — na Turismo 3 corremos com carros muito diferentes em potência e peso. E a falta de apoios continua a ser o maior problema: corro sem qualquer sponsor.” Ainda assim, o balanço é positivo. “Ficam memórias e amizades para a vida. Isto é o concretizar de um sonho. Quem nunca viveu lá dentro não entende a sensação.”
Olhar para o futuro
O Honda Civic está agora à venda. “Se aparecerem sponsors, volto em 2026. Caso contrário, será impossível. Com a TE Motorsport estamos a avaliar opções para 2027 — talvez um novo projeto, ou evoluir o Civic para a categoria Gr.A. Vai depender de apoios.”

Bruno Rodrigues encerra o ano com a serenidade de quem venceu a luta mais difícil: a de não desistir. “Sem a minha companheira, o Telmo Costa, a equipa e o meu irmão, nada disto seria possível. Foram o meu pilar.”
De França a Portugal, entre noites de oficina e dias de montanha, Bruno Rodrigues provou que o sonho de correr na Falperra pode mesmo levar um emigrante ao pódio nacional.



